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Posfácio nas Confecções Canhão de António Ferreira foi mais uma das curtas-metragens presentes no último dia da secção da competição nacional do Córtex em Sintra e é, assumidamente e sem qualquer pudor, uma das mais exeburantes.
Posfácio (Pedro Diogo) trabalha nas Confecções Canhão, propriedade da Senhora Canhão (Custódia Gallego), e namora com Claudete (Cleia Almeida), a sua filha. Tudo aparenta correr bem a Posfácio, não fossem os planos terroristas dos seus colegas Marques (José Geraldo) e Mendes (Pedro Correia) que, tendo os seus próprios e quase sempre ocultos motivos, teimam em destruir a fábrica onde todos trabalham.
Se por um lado esta curta-metragem criada no âmbito de Guimarães 2012 - Capital Europeia da Cultura é uma vencedora imediata pelo seu magnífico conjunto de actores que conseguem criar um interessante painel de personagens que têm tanto de excêntrico como de bizarro e que nos fazem desejar que este filme tenha muito mais tempo de duração para a sua mais aprofundada exploração, é também um facto que todo o ambiente recriado em torno das mesmas é visualmente rico e que contribui para a criação de um universo francamente alternativo, apelativo e que facilmente nos seduz.
Quase sem qualquer diálogo, sustentando-se maioritariamente através das marcantes expressões e expressividade dos actores, esta curta-metragem comunica com o seu público através de uma elevada componente cómica que nos prende ao ecrã com uma facilidade quase inata. À medida que as desastradas aventuras de "Posfácio" são sabotadas, quer por ele como por factores que desconhece ou até pelo mau timing das mesmas, é quase inevitável para o espectador não simpatizar com a sua inocência mesmo que por detrás das situações esteja escondida uma caricatura a uma realidade bem cruel.
O argumento de Tiago Sousa dá um cru e bruto retrato de um mundo laboral que infelizmente nem sempre (quase nunca) olha para o lado humano daqueles que o desenvolvem. Por entre um conjunto de maus tratos, desumanidade e acidentes de trabalho temos os actos daqueles que pelo meio tentam sobreviver quase que numa apologia do velho ditado "entre feridos e mortos alguém há-de escapar". Desde o novo e rico patronato encarnado por uma brilhante interpretação de Custódia Gallego aos funcionários desumanizados e vingativos aqui apelidados de "Marques" e "Mendes" (onde já ouvi isto), temos a última réstia de esperança através de um "Posfácio" que se afirma como a última tentativa de ligação entre os dois mundos que se separam pela força da luta de classes. De um patronato desumanizado a uma classe operária interventiva e que luta pelos seus direitos, mesmo que entretanto tenham esquecido quais são e prefira optar pela retribuição da violência, temos poucos que ainda permancem com coração mas aos quais, sem excepção, rendidos entregamos o nosso.
Todo o universo aqui recriado é, como já referi, assumidamente excêntrico e exuberante. Os dois factores que o conjugam na perfeição são, claro está, a sua forte e carregada fotografia da autoria de Paulo Castilho que intensifica os nossos sentidos com a sua utilização de cor e luz tão vivos como o próprio espírito daqueles "seres", e que são apenas suavizados através da descontraída banda-sonora de Luís Pedro Madeira sempre presente nos segmentos mais cómicos que, sejamos directos, são uma constante do início ao final desta curta.
O realizador António Ferreira mostra mais uma vez que tem um espaço próprio no cinema nacional e que em todos os seus trabalhos se reune de um conjunto de actores e demais profissionais, que trabalham numa química perfeita. O resultado final, como aqui está à vista, traduz-se numa atmosfera diferente e especial onde, por muito disfuncional que pareça ser, nos dá vontade de permanecer.
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9 / 10
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