segunda-feira, 4 de junho de 2018

Esta Noite que nos Chama (2016)

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Esta Noite que nos Chama de Francisco Morais e Miguel Pinto (Portugal) é uma curta-metragem com argumento da dupla de realizadores que conta um breve momento na vida de Luís (José Ceitil), um aparentemente pacífico comerciante de lãs que numa noite na sua loja é assaltado por Alex (Nelson Leão) e Sérgio (Pedro Bernardino). Mas aquele que parece um encontro do acaso cedo se transforma num inesperado ajuste de contas com o passado...
Esta curta-metragem ganha forma apresentando ao espectador a vida de um homem aparentemente simples. Já com uma certa idade, "Luís" trabalha num comércio local em franca decadência, vive só e toda a sua vida gira em torno de um conjunto de acções e momentos que já são parte de uma rotina de anos. Esta vida, característica de tantos que, tal como ele, já entraram na dita terceira idade, revela-se como símbolo de toda uma geração que agora, desamparados de qualquer apoio familiar ou social, se limita a (sobre)viver num mundo que aparenta já não ter lugar para ele(s). Mas, e se a vida de "Luís" esconder algo mais que não é revelado?
Quando a dinâmica de "Luís" é subitamente absorvida pela introdução de duas novas personagens - "Alex" e "Sérgio" -, o espectador rende-se à evidência de que algo mais irá surgir na vida de todos e que os seus destinos irão - algures - cruzar-se. Do assalto a algo mais carnal que possa colmatar as necessidades mútuas - para um talvez a quebra da sua solidão... para os outros mais algum dinheiro para satisfazer uma vida marginal... inicialmente não sabemos -, tudo passa pela mente do espectador que se deixa levar por esta dupla dinâmica num argumento que se revela consistente oscilando, no entanto, entre um aparente drama social e uma história de crime e talvez algum mistério.
Se aos poucos o espectador é surpreendido com os destinos das três personagens é, no entanto, a dinâmica recriada por um breve flashback que permanece na sua mente esclarecendo-o sobre os propósitos da dupla de jovens actores e das suas personagens que, para lá de um qualquer assalto, parecem condenados a um inesperado tormento que os ensombra desde um passado já - para eles - distante. E se as histórias de "Alex" e "Sérgio" não surpreendam em absoluto o espectador já "certo" daquilo que potencialmente os motiva, é sim "Luís" que se revela como o verdadeiro "lobo" que se esconde nessa vida dita "normal".
Não restam dúvidas que os predadores se escondem por detrás de rostos aparentemente normais - ou banais - com os quais todos nós nos cruzamos diariamente mas, no entanto, a dupla de realizadores e argumentistas consegue criar uma dinâmica de aparente solidão social a propósito de "Luís" que origina o mote da surpresa num espectador atento e preso à sua dinâmica inicial. É este mesmo efeito surpresa que revela não só a quebra da empatia que existia para com a sua personagem logo nos instantes iniciais, como desmistifica principalmente a noção de que marginal é apenas a dupla de jovens que tão veementemente desejam entrar na sua loja com o único pretexto de ganhar um dinheiro extra.
Consistente na sua trama e favorecida com três interpretações dignas e fiéis à mensagem que pretendem transmitir ao seu público, Esta Noite que nos Chama é o exemplo perfeito de um filme que se divide em dois momentos precisos levando inicialmente o espectador a criar uma ideia sobre a sua dinâmica para, de seguida, rapidamente a desfazer quando apresentados todos os elementos que dão cor e uma inesperada vida ao argumento transformando radicalmente até o próprio género da história.
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7 / 10
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