Entre Irmãos de Jim Sheridan é um, mais um, brilhante filme deste realizador irlandês desta vez remake de uma produção dinamarquesa sobre a família e os traumas de guerra, neste caso a do Afeganistão que tanto afectou (e afecta) a sociedade norte-americana.
A dar vida a esta filme temos três jovens e brilhantes actores. São eles Tobey Maguire naquele que é possivelmente o melhor papel de toda a sua carreira (sim, estou a considerar o Pleasentville também), Natalie Portman em mais um registo digno daquilo que esperamos dela, e Jake Gyllenhall aqui num papel mais secundário mas ainda assim à altura de qualquer um dos papéis principais que desempenhou até agora.
A história começa, como sempre nos filmes de Sheridan, com um drama familiar. Uma família desfeita onde um dos elementos é mais "marginal". Tommy (Gyllenhall) sai da prisão e Sam (Maguire), o seu irmão em vésperas de partir numa nova missão para o Afeganistão, é o único que o vai esperar.
O ambiente de família sente-se tenso. Muito tenso. Tommy não é necessariamente uma visita esperada e desejada e o seu pai (Shepard) faz questão de o apontar como o número dois.
Sam parte então rumo à sua missão no Afeganistão e depois de um acidente é declarado como morto apesar de ter sobrevivido e ter sido capturado pelos talibãs. Aquilo que se segue para ele é uma verdadeira prova de vida física e psicológica da qual sobrevive apenas a uma delas.
Quanto a Grace e a Tommy, estes começam a desenvolver uma relação cada vez mais próxima e cúmplice que se arrasta para além dos limites que ambos têm socialmente delineados, onde Tommy quase assume o papel de novo parceiro de Grace sem, no entanto, nada se ter materializado. Até ao dia em que descobrem que afinal Sam está vivo e de regresso aos Estados Unidos.
Esta história foca e toca muitos dos actuais problemas da sociedade norte-americana que à semelhança do que se passou há mais de trinta anos naquele país, lida agora com os traumas e fantasmas de uma nova guerra e de como ela corrompe, destrói e contamina os sonhos, desejos e esperanças de uma juventude que se encontra perdida e psicologicamente "morta" depois de cruzar os caminhos da guerra. De mais uma guerra que semelhante a tantas outras não sabem onde se encontra e o porquê de a lutarem.
Sam (Maguire) encarna aqui o último sobrevivente. Sobrevive a uma guerra, à tortura física e psicológica sendo que, no entanto, quase não consegue sobreviver àquele que será o seu ambiente natural e familiar. À sua rua. Ao seu meio. À sua família. É aqui que ele vai encontrar a maior "guerra". Uma guerra que sente não poder vencer. A "guerra" da inserção. O regresso. O porquê de ter regressado. O porquê de ter feito o que fez. O porquê da sua vida e o seu significado. Os porquês, todos eles.
Tobey Maguire tem aqui de facto uma interpretação magistral tanto pela sua transformação física como pela pesada carga dramática que carrega. Todo o excessivo controlo que tem no período pré-guerra como pelo descontrolo que depois se sente quando regressa a casa. Profundamente dramático e assustadora a transformação que este actor tem confirmando-o mais uma vez como potencial para estar entre os melhores.
Considerando os temas abordados neste filme não me espanta que ele tenha sido "esquecido" para os Oscars. Seriam filmes "a mais" sobre a mesma temática e possivelmente esta não seria reconhecida em nenhuma frente (assim pelo menos um deles "safou-se"), mas de facto é uma pena que Maguire não tenha recebido uma nomeação ao Oscar de Melhor Actor pois o seu desempenho é 100% merecedor de uma (e até de vencer). Mente aquele que diz que não se "assustou" com as descargas de loucura de Maguire no período de regresso a casa...
Se destes actores conhecidos não é de espantar que nos apresentem desempenhos de primeira linha, o facto curioso é quando uma destas interpretações surge de uma actriz tão jovem como é o caso de Bailee Madison (Isabelle) que interpreta a filha mais velha de Sam (Maguire). Brilhante a capacidade que esta actriz tem em mostrar como uma criança sente e pressente onde está a tensão e o "perigo" e como ele pode afectar drasticamente o seu pequeno e inocente mundo. À semelhança do que afirmei também com a outra grande obra de Sheridan, Na América, também aqui as jovens actrizes dão um contributo importantíssimo para o desenrolar da história, e no caso concreto desta jovem actriz, um contributo tão importante que a coloca como uma das peças fundamentais do filme pelo seu sentido e emocionante desempenho.
Jim Sheridan volta assim a confirmar o seu "dom" para contar histórias boas, apesar desta ser um remake, com um potencial dramático e emocionante no seu melhor. E consegue mais uma vez rodear-se de excelentes actores que dão tudo de si. O melhor e o pior. Entregam-se não só como actores mas como pessoas que depositam todos os seus sentimentos, posturas físicas e psicológicas ao dispôr de um magnífico trabalho, que de facto o é.
Decididamente Entre Irmãos é um dos grandes filmes que estrearam este ano e daqueles que ninguém que se preze como bom apreciador de bom cinema deva perder. Como sempre, mais uma pérola de Sheridan recheada também com uma belíssima banda-sonora.
"Sam Cahill: Only the dead have seen the end of war..."
10 / 10
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