segunda-feira, 19 de setembro de 2016

AWOL (2016)

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AWOL de Deb Shoval é uma longa-metragem norte-americana presente na Competição de Longas-Metragens da vigésima edição do QueerLisboa - Festival Internacional de Cinema Queer que agora decorre no Cinema São Jorge, em Lisboa.
Joey (Lola Kirke) vive num subúrbio perdido no interior dos Estados Unidos. Sem grandes objectivos ou propósitos para o seu futuro imediato, Joey pretende seguir uma carreira militar que lhe permita uma entrada mais facilitada na Universidade um dia mais tarde, até que conhece Rayna (Breeda Wool), uma mulher e mãe negligenciada por um marido rude e por quem se apaixona.
Num caminho que a divide entre um futuro mais promissor e um amor até então não sentido, Joey oscila sem conseguir perceber por qual optar. Poderá esta jovem tão perdida quanto o meio de onde provém encontrar o seu destino certo?
Tendo por base a curta-metragem homónina de 2010, Deb Shoval e Karolina Waclawiak escrevem o argumento desta longa-metragem que se centra, logo de imediato, em questões que qualquer espectador mais desatento identifica como uma certa realidade norte-americana prolífera em sonhos grandes demais para o momento imediato. Nesta terra de oportunidades e sonhos - muitos não cumpridos - AWOL retrata a realidade de uma jovem, comum a tantas outras, que se encontra perdida no espaço e divide o seu tempo entre trabalhos menores em feiras locais e um intenso desejo de poder ser alguém "melhor" num futuro que parece não querer chegar. Os planos, que facilmente se confundem com esses ditos sonhos não concretizáveis, perdem-se por entre desejos, ideais e um medo omnipresente sobre o que poderá ser melhor... arriscar o desconhecido ou manter-se fiel às suas raízes sabendo de antemão que o seu destino será ser "mais uma", entre tantas, mulheres que se torna "mulher de" e mãe no espaço de poucos anos sem que esse projecto faça parte do seu próprio imediato.
Com uma realidade que se apresenta cada vez mais limitada no que a escolhas e oportunidades diz respeito, "Joey" depara-se com o impensável... um amor platónico que rapidamente se confirma por outra mulher da sua pequena cidade: "Rayna", exuberante e propositadamente vistosa, consegue a sua atenção, e ambas desenvolvem uma relação tanto sentimental como sexual estando, esta última, já a viver o seu próprio - e aceitável para a sociedade - casamento que revela as suas próprias agruras e infidelidades. Com o sonho de uma família feliz, mas longe daquele espaço constrangedor e manipulador, onde todos se conhecem e onde a felicidade é impossível, a dupla de mulheres encontra a concretização da oportunidade nos braços uma da outra estando, no entanto, todo um outro futuro possível em risco. No limite da fronteira entre aquilo que é aceitável e o conforto de uma realidade que, não sendo boa, é garantida, a questão que o espectador (se) coloca é se existe a possibilidade destas duas mulheres serem algo mais do que um simples e ocasional affair que ambas recordarão como "aquela" oportunidade que em tempos se lhes proporcionou...
Com duas interpretações que estão - assumidamente - nos respectivos antípodas, Lola Kirke encarna a alma e o espírito de alguém que sabe merecer - e querer - algo mais do que as limitações sociais, económicas e sexuais que o seu meio lhe "impôs" estando disposta a lutar contra elas - curiosa a escolha de um eventual futuro militar associado a essa "luta" - e um dia obter a sua própria libertação e futuro... mesmo que para tal se necessite descolar de todo um passado que a marca. No outro lado da barricada encontramos Breeda Wool, uma mulher que abandonou os seus sonhos e se entregou a uma vida controladamente infeliz num relacionamento que não só não o sente como se deixa viver por uma estranha conveniência sob a alçada de um marido a quem ela apenas interessa quando chega a casa vindo de longas temporadas na estrada.
Do vazio de sonhos e desejos à esperança de uma vida melhor, estas duas mulheres caminham num limbo afectivo e sentimental onde "Joey" sonha com um amor e "Rayna" se condiciona com um lado (não) confortável de uma vida à qual se habituou. O espectador, que caminha este limbo com as duas, reconhece que o impossível é apenas e só delimitado por elas, pelos seus entraves psicológicos e pela já referida incerteza que as - mais a "Rayna" - condicionou ao hábito de uma vida (certa) mas infeliz.
Com um retrato fiel - penso - de um interior profundo dos Estados Unidos em que apenas a esperada limitação de uma vida corresponde à certeza de um destino sonhado e perdido, AWOL concentra ainda a tal vontade de viver um profundo e cúmplice amor mesmo que voluntariamente incompreendido ou negado por aqueles que a - a "Joey" - rodeiam. Desejo esse que persiste no seu interior e que quer viver... mesmo que tenha de desafiar todas as regras e compromissos de uma vida que será, a partir de então, perdida. Contido, e raramente exuberante, AWOL revela para lá do acto final cometido por "Joey", o seu sempre presente estado sentimental que longe das expectativas dos demais (cor)responde, única e exclusivamente, ao seu desejo de algo por vezes tão proibido... ser feliz
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7 / 10
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