Baskin de Can Evrenol é uma longa-metragem turca em competição ao Prémio de Melhor Longa Europeia desta décima edição do MOTELx - Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa que amanhã termina no Cinema São Jorge.
Num restaurante onde falam de banalidades sobre as suas vidas, cinco polícias turcos recebem um telefonema sobre um incidente na localidade de Inceagac, conhecida pela ocorrência de estranhos acontecimentos. É no caminho para Inceagac que Remzi (Ergun Kuyucu), Arda (Gorkem Kasal), Apo (Fatih Dokgöz), Yavuz (Muharrem Bayrak) e Seyfi (Sabahattin Yakut) se deparam com acontecimentos que marcam a sua viagem e com um atropelamento que define todo o rumo do seu caminho. Numa viagem que os leva à antiga sede da polícia de Inceagac, os cinco polícias encontram finalmente os seus destinos e uma revelação sobre o propósito de toda esta viagem.
Can Evrenol que já havia iniciado esta história com a curta-metragem homónia de 2013, escreve o argumento da longa em parceria com Ercin Sadikoglu, Cem Ozuduru e Ogulcan Eren Akay que inicialmente dispersa o espectador para uma história sobre um grupo de polícias amigos e cúmplices que num restaurante perdido no meio do nada debatem sobre aventuras passadas e histórias que, no fundo, os levaram até ao nível de amizade que agora partilham. "Arda", aquele que mais recentemente se juntara ao grupo é, no fundo, aquele que escuta as histórias de todo o grupo como se de um ritual de inserção se tratasse. Mais ou menos interessado nas mesmas, "Arda" é o centro de todo um conjunto de acontecimentos que parecem não se manifestar em si directamente mas, por sua vez, junto dos seus parceiros de trabalho.
O espectador percebe - ou vai percebendo - que aquele local tem tudo menos de normal ou convidativo. Sem outros clientes presentes e com um grupo de funcionários que só por si já parecem comprometidos o suficiente com uma qualquer missão, é no que não vemos que reside toda a curiosidade e, de certa forma, a resposta para um conjunto de perguntas que gostaríamos de ver respondidas mas que a seu tempo encontrarão essas respostas. Junto a um controlado "Remzi", a um "Apo" divertido, a um "Yavuz" que procura afirmar-se, é "Seyfi" que começa a manifestar os primeiros sintomas de que algo ocorre(u) e que eles - e nós - desconhecemos. São as suas dores de cabeça (mais tarde explicadas pela sucessão de acontecimentos), que condicionam a acção do filme a um ciclo que só bem perto do final compreendemos - e que o mesmo justifica e confirma - levando então o espectador a compreender que o limbo - ou purgatório - em que se encontram e que estão perante um destino já confirmado mas ainda não aceite que os condiciona a uma sucessiva multiplicidade de acontecimentos que, na realidade, já terão vivido.
Baskin - dominante em turco - poderá assim referir-se não só ao espaço em que o grupo se encontra que os obriga a uma ilusória ideia de uma liberdade que não possuem levando-os, portanto, sempre ao mesmo local, aos mesmos espaços e a uma repetida vivência de acontecimentos aos quais não conseguem escapar ou, no entanto, ao ideal de um inferno vivido, onde o poder, a influência e até o alcance do mal chegam a todo o lado sem limites, sem travões ou fronteiras condicionando a uma vontade já estabelecida, todos aqueles que decide controlar ou dominar. O passado - ou a memória que dele se tem - como um reflexo da ideia de que a história realmente se repete e que todos os acontecimentos estão, de certa forma, já equacionados à espera de acontecerem - ou de se repetirem - é, também ele, um importante elemento na narrativa e dinâmica de Baskin, na medida em que aos poucos e pela união de pequenos elementos a que o espectador vai tendo acesso, confirma que aquele limbo e espaço imutável onde os cinco polícias se encontram é o (agora) primeiro passo que têm de confirmar para que toda uma repetição de acontecimentos se suceda. No fundo, é esta mesma repetição com base no que já viveram que alimenta a sua ilusão de "vida" como que numa espera por algo novo que já não controlam e que apresenta - ao espectador - os elementos necessários para compreender que tudo já foi visto, vivido e conhecido (deles) mesmo que não se recordem.
Se as interpretações dos cinco homens se completam entre as várias facetas, dinâmicas e comportamentos humanos é, no entanto, a de Mehmet Cerrahoglu como o representante de algo "não humano" na Terra - ou pelo menos naquilo que pensamos inicialmente ser a Terra tal como a conhecemos - que consegue dominar todo este filme apesar dos seus breves e escassos minutos de desempenho. Várias poderiam ser as palavras utilizadas para o caracterizar mas no fundo, aquelas que são mais correctas são as mesmas que se poderiam utilizar para descrever todo o segmento final de Baskin... Provocador, depravado, imoral, insensível e degradante são as expressões que os descrevem como o reflexo - ou (falta de) alma - um de outro - filme e actor - e que conseguem criar uma intensa repulsa por parte do espectador que sem criar nenhuma especial empatia com nenhum dos polícias (des)espera pela sua salvação num lugar perdido e abandonado ou a dita esperança deixou de habitar há muito tempo.
Um interessante filme de terror pela expressão de imoralidade que consegue recriar, Baskin é, no entanto, uma implacável resposta e afirmação sobre o velho ditado de que a História se repete... no terror, na vida, nos factos e acontecimentos e sobretudo na desatenção do Homem face aos pequenos e por vezes evidentes sinais que se cruzam pelo seu caminho.
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7 / 10
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