terça-feira, 27 de novembro de 2018

Os Dois Irmãos (2018)

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Os Dois Irmãos de Francisco Manso (Portugal/Cabo Verde) é uma das longas-metragens em competição na XXIVª edição dos Caminhos do Cinema Português a decorrer no Teatro Académico Gil Vicente, me Coimbra cujo argumento de José Fanha baseado na obra de Germano de Almeida conta a história de André (Flávio Hamilton) regressado a casa no interior de Cabo Verde depois de anos a viver em Lisboa. Aí, o pai revela-lhe que o irmão João (Che Gonçalves) esteve envolvido com Maria Joana (Janeth Tavares), a sua mulher.
Num momento em que André revela querer avançar com a sua vida em Lisboa, família e antigos amigos exigem justiça... André, desesperado com o isolamento e ostracização da comunidade, rapidamente terá de agir.
De destacar nesta história é o imediato choque entre os vários membros desta comunidade que primeiro recebem um dos seus vindo da antiga metrópole como um elemento mais "evoluído" que agora mal reconhecem. Assim, o provocado choque entre a sociedade do século XXI e o rural e tradicional que se mantêm intactos num ambiente no qual a dita evolução ainda não se manifestou fica latente por esta chegada como principalmente pelas constantes manifestações de um sistema que se rege e governa pelo "costume" e pelos velhos hábitos que os antigos clãs estabeleceram, fazendo da prática comum a lei pela qual todos se governam. Nesta perspectiva, não só a chegada de um "André" que poucos já reconhecem como um dos seus é um elemento "estrangeiro" e estranho como  também lhe é exigido que respeite as leis da comunidade ostracizando um irmão e uma mulher que se envolveram durante a sua ausência. Mas, na realidade... quem serão estas pessoas que, em tempos, foram as suas?
"André" é o protótipo de alguém dividido entre esses dois referidos mundos... por um lado fiel aos seus costumes e tradições, à sua família e antigas paixões bem como ao espaço que o viu nascer e que, de certa forma, mantém como a sua principal referência enquanto o homem que é. Por outro, é este mesmo espaço e as suas gentes que são, na realidade, também inesperados estranhos não só por se encontrarem num patamar social diferente do seu mas também pela sua realidade que exige uma vingança para com um acto que o próprio cometera nessa Lisboa distante. Qual a necessidade de se vingar ou mesmo de exigir uma inexistente justiça quando o próprio não só não quer saber do sucedido como também ali chegou para dele se distanciar definitivamente?! Poderá (ou quererá) ele manter algum tipo de laços quando os próprios intervenientes apenas o desejam se forem selados com sangue?
É com esta perspectiva em mente que toma lugar o outro momento do filme, já em tribunal, quando depois de um crime cometido se exige o julgamento do mesmo. Assim, numa constante revelação de momentos, o espectador observa, percebe e regista não só a (in)operatividade de todas as forças - política, justiça e política - como principalmente as toma como meras paródias de um poder absoluto e não questionado que opera no local mais respeitando esse dito "costume" do que propriamente as leis do país que apenas se aplicam numa capital... também distante. Será "André" o último bastião da aplicação dessa justiça ou apenas alguém em mera transição e cujo destino será... incerto?
Os Dois Irmãos funciona assim como o registo de uma história moral e social que exibe o directo conflito entre rural e urbano, que opõe as diferenças inerentes a cada um deles e sobretudo como a extrema necessidade da pertença do Homem ao seu ambiente primário o expõe a uma pressão que o condiciona não só no seu pensamento como sobretudo nos seus actos... nada é deixado impune... principalmente as acções de um homem no seu pensado limite.
Ainda que interessante de um ponto de vista de análise dos dois meios em questão, Os Dois Irmãos é uma longa-metragem extremamente frágil no ponto de vista da sua execução onde não só um certo amadorismo dos actores compromete a mensagem que se pretende transmitir como também os elementos técnicos desta história parecem mais depressa a querer transformar num segmento de uma qualquer sitcom do que propriamente numa história forte e coesa que exponha o referido choque de culturas que se opõem. Do drama social de um "André" entre mundos aos momentos tendencialmente mais cómicos - propositados ou não... nunca saberemos - esta longa-metragem sofre sobretudo pelo descrédito que tende a afirmar do que propriamente pelas incoerências de um argumento que poderia ser não só mais elaborado como mais convicente do ponto de vista da sua mecânica versus mensagem.
Com interpretações de Flávio Hamilton e Che Gonçalves capazes de dinamizar o grande ecrã - tivessem elas tido mais e melhor margem de manobra para expôs os conflitos das suas personagens - e um ambiente natural propício a uma moderna história de vingança, tivesse Os Dois Irmãos sido mais consistente e encontraríamos aqui uma história que a ninguém envergonharia.
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3 / 10
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